Deus me confunde (Pequenas reflexões - Parte II)



Eu me lembro da primeira vez que vi uma Pitanga. Eu devia ter uns 9 anos e estava num clube, divertindo com a família e eu vejo uma árvore pequena que tinha pequenos frutos laranjas - uma das minhas cores favoritas.

É Pitanga. - Meu pai me revelou e aquela lembrança não esqueci. Parecia uma abóbora, mas tão pequenininha. Quero que ande comigo!

Este ano, sentada com uma florista, escolhia o buquê de noiva para meu possível casamento de novembro, a qual estava tudo preparado. Uma das cores seria laranja e, de todas as frutas que teriam na festa, eu queria pitanga no buquê, entrando de branco carregando uma floresta viva, como eu me sentia na época. Ela era eu.

Outubro passo pela universidade e vejo pitangas pelo chão. Um pé cheio, farto e belo.

Mas eu não sou mais criança, nem sou mais noiva. Os sonhos dessas duas épocas foram frustrados e eu mesma não sou a mesma. A árvore deveria estar murcha, azeda, como sinal de retraimento.
Mas tomei a fruta na mão e experimentei: que doçura! Como pode? Como pode dentro de mim ainda ter doçura?

E nessa criação sagrada eu vejo a ambiguidade de Deus, a sua permanência e a sua não lógica. A doçura sendo sua vontade - ainda que seja noite, como diria São João da Cruz.
Deus me confunde quando está ao lado de Jó, tira seus filhos, sua vida e, por fim, dá outros filhos. E Jó, nessa troca ilógica e até imoral, entende o sentido de Deus: antes eu conhecia só de ouvir falar.
Deus me confunde quando faz Jesus sofrer tortura, mesmo o amando. O próprio Cristo questionar o Pai pelo abandono. Que Deus ambiguo em si mesmo!

E é claro que a sua criação é confusa, numa lógica que para nós é cruel, mesmo assim, faz Pitangas doces.

Mas a loucura está aí para isso, para nos salvar dessa sociedade que nos parece "coerente". Deus não nos deixa conformar com esse século. Deus está na loucura, nessa confusão que não merece romanização. É dura. Pesada e mesmo assim tem Pitanga doce.

Deus ainda faz hoje Pitangas doces

17 de outubro de 2017

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