A virtude de ser jovem
O texto de reflexão está baseado
na primeira epístola a Timóteo, capítulo 4, versículo 12 que, adaptado, diz:
Ninguém as despreze pelo fato de você serem jovem, mas sejam exemplo para os
fiéis na palavra, no procedimento, no amor, na fé e na pureza.
Primeiro fator que precisamos
lembrar, ao adentrar esse texto, é que Paulo está escrevendo a Timóteo, um
jovem criado na fé que, por uma questão geracional, não percebia que poderia
ser útil para o Reino como gostaria. Na
época, havia a concepção de que aqueles que eram jovens ainda não possuiriam
maturidade espiritual, capacidade de serviço como os anciãos ou aqueles que
foram denominados presbíteros (isso é, pessoas de mais idade). De uma forma diferente, vemos a juventude hoje
ser desvalorizada e morta em nossa sociedade como um acréscimo inútil, mais um
no número de desempregados, mais um para se tornar marginal. Com os movimentos
sociais esvaziados, com poucas esperanças para o futuro político e econômico,
os jovens se sentem como velhos impotentes, vendo as informações passarem
rápido, nostálgicos e medicalizados por ansiolíticos e antidepressivos.
Porém, a Bíblia coloca o jovem num lugar bem diferente. Não é
incomum vermos textos em que a juventude é vista como o tempo da oportunidade,
força e vigor para o futuro. Na primeira epístola de João mesmo se comenta, no
capítulo 2, 14: jovens, eu escrevi a vocês, porque são fortes, e em vocês a
Palavra de Deus permanece, e vocês venceram o Maligno.
Logo, percebemos da parte de Deus
um desejo para que essa juventude seja usada e não desperdiçada. No texto de
Paulo para Timóteo, o autor retoma essa ideia bíblia de que a juventude é um
momento para ser exemplo. Diferentemente da concepção vigente de que o jovem é
um receptor que não tem o que contribuir, Paulo recoloca esse jovem como aquele
a ser visto, copiado no meio da comunidade a partir de cinco características
importantes.
Primeira forma exemplar que Paulo
comenta é através da palavra, sendo
aqui referente ao falar. Na carta de Tiago, capítulo 3, o autor relata que a
língua é fogo e que esse pequeno órgão pode, ao mesmo tempo, amaldiçoar quanto
abençoar. Em um momento onde todos possuem opiniões sobre todos os assuntos, em
meio a discursos machistas, homofóbicos, racistas e tantos outros que
amaldiçoam a vida de outros, o jovem cristão é chamado para ser luz no seu
dizer. A palavra como benção está ligada ao potencial de trazer vida aqueles
que ouvem, produzir melhores relacionamentos, abrir portas para se aproximar de
Deus. Não se trata da formalidade da língua, se culta, piada, palavrão ou
erudita, mas do quanto aquela palavra pode florescer na vida da pessoa. Por
isso, cabe lembrar do texto referente ao evangelho de Mateus, que a boca fala daquilo que está cheio o
coração, então que seja a benção aquilo que nasça dentro do jovem que quer
romper com esse mundo de palavras mortíferas.
O procedimento é o
segundo tema que Paulo pontua ao considerar o exemplo desse jovem, pois para o
apóstolo está muito claro que não basta o discurso bonito, sem que haja uma
prática viva. Trata-se do que Tiago, novamente de sua epístola, enfatiza quando
diz que a fé sem obras é morta. Temos vivido em um momento em que o discurso
acolhedor e engajado tem se resumido a uma aparência de tal, com versículos e
textões enquanto ainda é confortável. Porém, isso é morto na vida prática. Quem
convive com crianças sabe muito bem de que se você conversar algo com elas e
logo em seguida fazer outras coisas, esta vai reparar. E, reparando, vai imitar
exatamente aquilo que você fez e não o que disse. A vivacidade do que se fala
está na capacidade de transformar seu discurso em estilo de vida e Paulo sabe
disso quando instrui Timóteo.
O amor, que no
evangelho de João é dito como o que identificaria os discípulos, entra também
no hall dos pontos centrais para a vida daquele que quer ser exemplar. Da mesma
forma que o agir vivifica as palavras, o amor vivifica a ação, ressignifica,
reconfigura aquele ato para um novo sentido. O amor, muito longe de ser um
sentimento, é a própria essência de Deus, o que motiva sua misericórdia, seu
perdão e, no caso do cristão, estrutura o estilo de vida que este deve levar.
Na escolha do procedimento correto, quem vai conduzir é o amor.
Paulo também pontua um dos temas centrais de suas epístolas,
que é a fé. Na igreja em que estou,
a Igreja Cristã Carioca, tivemos um debate sobre o profeta Habacuque a qual estávamos
definindo a palavra “fé”, no Antigo Testamento. Uma das interpretações mais
próximas era “agarrar”, como uma demonstração de dependência total. Apesar do
distanciamento linguístico, a formação de Paulo como judeu deve ter em sua
bagagem essa leitura. Dizer que um jovem pode ser exemplo na fé diz respeito ao
fato de que não importa as obras que este faz se não perceber que sua esperança
depende totalmente, está agarrada em Deus. A fonte das oportunidades da
juventude está nesse relacionamento, de liberdade e, ao mesmo tempo, total
suprimento espiritual.
Por fim, a tão polêmica pureza
é citada como um espaço para o jovem ser referência. A partir desse termo,
pode-se haver diversas chaves de leitura. A mais comum diz respeito a
possibilidade do cristão negar-se a viver certas experiências, ao que o fecha
ao mundo e se separa pela exclusão. Tendo em vista a leitura de um jovem como
aquele que tem vida, esperança e oportunidade, esta leitura não faz sentido. Se
observarmos o exemplo de Jesus, o homem mais puro que se viveu na Terra, não
temos um relato de alguém que deixou de viver, de beber, comer, andar com quem
quisesse. O que definia sua pureza – ou, em outros termos, santificação e
separação – eram suas escolhas baseadas no amor. Ser puro é, como disse a
oração do Cristo, estar no mundo e se livrar do mal. A pureza é a prática do
amor, que não se importa com a maldade do mundo, mas com aquilo que pode
acrescentar espiritualmente. É uma escolha de pureza negar-se a viver pela
ganância, inveja, competição, a vaidade e tantas outras características que,
aos olhos do mundo são puros, mas não se encaixam com a vida de Jesus.
Desse modo, nos lembramos disso: Deus fez a juventude para a esperança, para o futuro, para a luta.
Siga nesse desejo. E, na epístola de Paulo, temos cinco instruções: usar as
palavras para abençoar, sermos coerentes no agir, regar a vida no amor, demonstrar
dependência espiritual de Deus e fazer as escolhas do Reino. Assim, viveremos
como jovens que realmente consegue construir esse futuro conforme instruído por
Cristo.
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Esse material é referente a pregação que realizei no aniversário de Priscila e Raquel Lins, em janeiro de 2017. Algumas partes foram acrescentadas, porém a ideia central é a mesma.
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